UMA COLEÇÃO DE ALMAS

UMA COLEÇÃO DE ALMAS

Por quantas almas uma estrada é responsável?

Ia eu despreocupada para faculdade, ainda com a fita gravada da aula anterior tocando (era quando dava tempo de eu estudar) numa pista de mão única.

A pista tinha sido recapeada, exceto no acostamento. Ai, ai, ai… Eis que o caminhão na minha frente, desce com duas de suas seis rodas no desnível do acostamento.

O barulho da carga escorregando, as cordas estourando pela pressão das toras, caindo e se lançando para os lados como setas mortais.

Aterrorizante pois, fato contínuo, o motorista percebendo a desgraça, parou o caminhão no meio da pista.

Como não bastasse, ele pulou da boleia, com um facão enorme, atacando todas as cordas que pode, tentando minimizar a perda.

Mas, não houve jeito.

As toras começaram a despencar todas pelo lado que o caminhão pendia, e algumas faceiras pelo lado oposto pela pressão sobre elas.

A pista toda se encheu de toras e o caminhão virando manhoso e malandro na direção do precipício, o motorista alucinado, contemplando aquilo, impotente.

Nós, os carros em volta, ficamos rezando para que as toras nos errassem.

Todas me erraram, mas acertaram outros.

E eu estava atrás do caminhão.

As toras rolavam felizes para os lados, se atirando na ribanceira, uma após outra, ganhando liberdade.

Pareciam uma comissão de bruxas saltitando sob Carmina Burana.

Enquanto eu ainda tentava decidir se ficar ou correr…

O caminhão, rangeu, gritou, agoniou, virou, tombou no abismo gemendo, como se sua alma estivesse reclamando seu corpo.

Depois disso, cada um que estava no seu carro, ou voltava para seu carro, acelerou e partiu para um próximo capítulo da vida.